Se você já observou atentamente a asa de um avião — especialmente perto do bordo de fuga no winglet, ailerons, profundor ou estabilizador vertical — deve ter reparado em pequenas hastes pretas ou metálicas que se projetam para fora. Esses componentes são conhecidos como dissipadores de carga estática (static dischargers ou static wicks), e desempenham um papel essencial para a segurança e para o correto funcionamento dos sistemas de navegação e comunicação da aeronave.
Por que a carga estática é um problema na aviação?
Durante o voo, a aeronave está continuamente:
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Friccionando o ar
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Cruzando nuvens carregadas
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Passando por regiões de umidade
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Encontrando partículas de gelo e poeira
Essa interação constante gera eletricidade estática, que se acumula na fuselagem e nas asas — o mesmo efeito de arrastar os pés no tapete e levar um choque ao tocar uma maçaneta.
Em um avião, porém, essa carga não pode simplesmente ficar acumulando. O excesso de eletricidade estática pode:
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Interferir nos sistemas de navegação (VOR, ILS, GNSS)
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Causar ruídos em comunicações VHF
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Gerar faíscas perigosas durante o abastecimento
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Prejudicar antenas e sensores externos
Por isso, a aeronave precisa eliminar essa carga de maneira controlada e segura.
Onde entram os dissipadores de estática?
Os dissipadores de estática são pequenas hastes flexíveis instaladas nos bordos de fuga das asas e superfícies móveis, porque:
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Essa é a região onde o fluxo de ar está mais turbulento
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A borda de fuga é naturalmente um ponto de concentração de cargas
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A geometria favorece o desprendimento da eletricidade
Eles funcionam como “escapamentos” de carga elétrica, permitindo que a aeronave libere gradualmente a eletricidade acumulada na fuselagem para a atmosfera.
Como eles funcionam?
Cada dissipador:
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Tem uma ponta altamente condutora
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Está conectado à estrutura da aeronave
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Permite que a carga se disperse para o ar em forma de íons
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Evita a formação de faíscas perigosas
É um processo contínuo: enquanto o avião voa, os static wicks estão constantemente “descargando” pequenas quantidades de eletricidade no ar.
Por que ficam no bordo de fuga?
A posição não é aleatória.
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No bordo de ataque, o ar é mais limpo e laminar, dificultando a dissipação.
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No bordo de fuga, o ar está mais turbulento, facilitando a emissão de íons.
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A extremidade da asa (wingtip ou winglet) concentra ainda mais cargas, por isso há vários dissipadores naquele local — como mostrado na imagem acima.
E a relação com abastecimento e grounding?
No solo, antes do abastecimento, o avião e o caminhão são ligados por um bonding cable (cabo de equalização).
Isso impede faíscas durante o fluxo de combustível.
No ar, esse papel é feito pelos dissipadores de estática.
Ou seja:
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No solo: equalização por cabos
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No ar: equalização por dissipadores
Ambos têm o mesmo objetivo: evitar descarga elétrica descontrolada.
Conclusão
Os pequenos “pelinhos” no bordo de fuga das asas não são enfeites: eles são componentes essenciais para a segurança da aeronave. Os dissipadores de estática garantem que:
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Os sistemas de navegação funcionem livre de interferências
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As comunicações permaneçam estáveis
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Não haja risco de descargas perigosas
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A aeronave opere dentro do envelope eletrostático seguro
É um exemplo perfeito de como a aviação incorpora soluções simples, discretas e extremamente eficientes para lidar com fenômenos complexos.

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Marcuss Silva Reis