Introdução
Durante décadas, a aviação simbolizou liberdade, aventura e status. Ser piloto era o sonho dourado de muitos meninos e meninas que olhavam o céu e imaginavam o som dos motores rasgando as nuvens. Hoje, no entanto, essa magia parece ter perdido altitude.
Mas por que o jovem de hoje demonstra tão pouco interesse por uma área que representa o auge da tecnologia e da conquista humana?
A resposta não é simples. Ela envolve transformações culturais, econômicas e tecnológicas — e um mundo que mudou muito mais rápido do que o avião supersônico que um dia simbolizou o futuro.
💰 1 O custo do sonho
O primeiro grande obstáculo é o preço da formação aeronáutica.
Tornar-se piloto profissional no Brasil pode custar entre R$ 250 mil e R$ 400 mil, dependendo do tipo de curso, aeronaves utilizadas e quantidade de horas necessárias.
Diferente de países como os Estados Unidos, aqui não existem linhas de crédito estruturadas para a formação aeronáutica — algo que desestimula até os mais apaixonados.
Muitos jovens simplesmente não têm como financiar esse sonho.
E quando o ideal se torna inacessível, a paixão dá lugar à frustração.
🌍 2. Um mundo de novos fascínios
Na década de 1980, um adolescente via um Boeing 747 e sonhava.
Hoje, ele vê um drone com câmera 4K, um simulador realista no computador ou um foguete da SpaceX e se encanta com outras dimensões da aviação e da tecnologia.
A geração digital vive a experiência de voar virtualmente, sem sair do quarto — e isso muda completamente a relação emocional com o “ato de pilotar”.
O fascínio pelo voo não acabou, ele apenas se transformou.
🧭 3. A perda do “encantamento”
A aviação moderna é extremamente segura, precisa e automatizada — o que é ótimo sob o ponto de vista técnico, mas menos inspirador.
O piloto já não é visto como o herói solitário enfrentando tempestades; é um gestor de sistemas complexos, que monitora instrumentos e cumpre procedimentos padronizados.
A mística da aviação, aquela que fazia jovens escreverem cartas para aeroclubes pedindo uma chance de voar, foi substituída por checklists e protocolos.
A aviação ficou eficiente, mas menos romântica.
🏫 4. Falta de incentivo educacional
Nas escolas, quase não se fala de aviação.
Os alunos aprendem sobre biomas, ecossistemas e energia solar — mas não descobrem que existe uma indústria inteira de oportunidades no céu: mecânicos, controladores de tráfego, engenheiros, comissários, meteorologistas e gestores aeroportuários.
Sem acesso à informação, o sonho não nasce.
Projetos educacionais voltados à aviação poderiam reacender esse interesse desde cedo, integrando o tema à ciência, à física e à matemática de forma inspiradora.
⚙️ 5. Instabilidade e realidade da profissão
Quem se forma piloto hoje encara um mercado competitivo, cíclico e instável.
A pandemia, as falências de companhias e a alta do dólar mostraram o quão vulnerável é a carreira.
Além disso, as novas gerações valorizam qualidade de vida, flexibilidade e propósito, enquanto a aviação impõe rotinas rígidas e longas ausências familiares.
O sonho ainda é grande, mas o preço pessoal também é.
🕊️ 6. Como reacender o voo
Para que os jovens voltem a olhar o céu com o mesmo brilho nos olhos, é preciso reencantar a aviação.
E isso passa por:
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Projetos escolares e universitários que apresentem as profissões aeronáuticas;
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Programas de financiamento acessível, que tornem a formação possível;
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Resgate da história da aviação brasileira, com seus heróis e pioneiros;
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Integração entre o mundo digital e o real, como simuladores, drones e experiências imersivas que despertem curiosidade.
A aviação precisa voltar a ser história viva, não apenas uma rotina operacional.
✈️ Conclusão
Os jovens não deixaram de sonhar — apenas mudaram o foco dos sonhos.
A missão de quem ama a aviação, portanto, é reconectar essa nova geração com o céu, mostrando que a tecnologia e o propósito de voar continuam sendo uma das maiores expressões da engenhosidade humana.
Enquanto houver alguém disposto a olhar para o alto e se perguntar “como seria estar lá em cima?”, o sonho da aviação nunca deixará de existir — ele apenas espera por novas asas.
✍️ Sobre o autor
Marcuss Silva Reis é piloto profissional, instrutor e professor de aviação civil com larga experiência na formação de profissionais para o setor aeronáutico.
Foi um dos pioneiros na estruturação do ensino superior em aviação no Brasil e é membro fundador do Instituto do Ar.
Economista, pós-graduado em Ciências Aeronáuticas, Segurança da Aviação Civil e Docência do Ensino superior.

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Marcuss Silva Reis